Angola: TC considera inconstitucional condenação de "Zenu"
Lusa
De acordo com o TC angolano, foram igualmente violados os princípios do julgamento justo e conforme e do direto à defesa.
Para o plenário dos juízes do TC, em acórdão datado de 03 de abril de 2024 e hoje tornado público, o arresto os bens dos arguidos violou os princípios constitucionais referindo, no entanto, que o recurso procede, devendo os autos baixar às instâncias devidas "para que sejam expurgadas as inconstitucionalidades verificadas".
A posição do TC vem em resposta ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade remetido ao órgão por Valter Filipe da Silva, Jorge Guadens Pontes Sebastião, José Filomeno dos Santos "Zenu" e António Samalia Bule Manuel condenados pelo Tribunal Supremo, em 2020, pela prática dos crimes de peculato, burla por defraudação e tráfico de influência, com penas fixadas entre cinco e oito anos de prisão, no conhecido caso "500 milhões".
Entendem os requerentes que o acórdão do Supremo não observou o princípio da legalidade pois, "fez tábua rasa a questões prévias essenciais para a descoberta da verdade material", tais como, "ter desvalorizado" as respostas dadas pelo então Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, que morreu em julho de 2022 em Espanha.
Violação dos princípios da legalidade, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, da ampla defesa, da presunção de inocência, do processo justo e equitativo, do dever de fundamentação das decisões judiciais e do contraditório estão entre as queixas dos recorrentes.
De acordo com o plenário do TC, houve uma "desconsideração" do Tribunal Supremo em relação à carta constante dos autos, assinada pelo declarante José Eduardo dos Santos, em que autoriza Valter Filipe da Silva, ex-governador do Banco Nacional de Angola (BNA), a movimentar somas de dinheiro.
Referem que o julgamento foi conduzido sem a valoração da carta de José Eduardo dos Santos, considerada "essencial para a descoberta da verdade material" colocando assim em causa a salvaguarda de garantias constitucionalmente consagradas, o direito à defesa e o princípio do contraditório.
Perante o conteúdo das respostas, assinala o Constitucional, o Supremo desvalorizou a carta-resposta de José Eduardo dos Santos por considerar não terem sido cumpridos os requisitos de autenticação da assinatura do declarante, nem mesmo o procedimento legal de envio.
"Em face ao exposto, esta corte entende que, por não ter sido admitida da carta-resposta do antigo Presidente da República, nos termos em que ocorreu, o acórdão objeto do presente recurso violou os princípios da presunção de inocência e do contraditório, bem como o direito à defesa", lê-se na decisão, de 22 páginas.
Conclui igualmente o Constitucional angolano que foi violado o direito a um julgamento justo e conforme, à luz das normas da Constituição angolana, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.
O plenário entendeu também afastar da moldura penal concreta o crime de burla por defraudação, imputados os requerentes, "por não estarem reunidos os elementos do tipo" e nesta condição o TC infere que não foi posta em causa a alegada violação do princípio da imutabilidade da acusação.
Quanto à queixa sobre violação do direito a um julgamento justo, consideram os juízes que foram verificadas desconformidades constitucionais de certos procedimentos tomados no decurso do processo, como é o caso da não admissibilidade de prova documental relevante (carta do antigo Presidente da República), concluindo existir violação desse direito.
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