Adalberto Costa Junior: "Não há razão para se adiar as autárquicas para além de 2025" (RFI) - Rádio zango 8000

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sábado, 15 de junho de 2024

Adalberto Costa Junior: "Não há razão para se adiar as autárquicas para além de 2025" (RFI)

 Adalberto Costa Junior considera que dentro de 30 dias as eleições autárquicas podem estar aprovadas em Angola e que o primeiro escrutínio deste género terá de acontecer até 2025. ano em que o país assinala 50 anos de independência. O líder da UNITA denuncia um "clima de violação das leis", em que a liberdade no país está limitada para todos, desde os partidos da oposição aos jornalistas, avisando que se aproxima o tempo da mudança em 2027.


O líder da UNITA esteve em Paris para participar na conferência internacional sobre “Democracia em África”, realizada pela IDC-África, a componente para África da Internacional Democrata Centrista e na RFI falou sobre os desafios de Angola, nomeadamente a concretização das eleições autárquicas, mas também da falta de liberdade no país e a fome.

RFI: Na quarta-feira, pela primeira vez, houve deputados da UNITA presentes nas celebrações do Dia da Rússia, em Luanda. Isto significa que a UNITA está a mudar a sua posição em relação a este conflito?

Adalberto Costa Junior: Não foi a primeira vez e quem lhe fala esteve mais do que uma vez na embaixada da Rússia nos últimos anos e vários outros colegas. Penso que, neste contexto não há novidade, na medida em que nós nunca tivemos dificuldade em ter diálogo na pluralidade. De facto, nesta comemoração do aniversário da Rússia, houve uma delegação de deputados que lá esteve e também acompanhei o que foram os pronunciamentos do embaixador que dirigiu algumas palavras pomposas de reconhecimento à própria UNITA na sua presença. Mas quero lhe dizer que não, não é novidade. A UNITA tem estado presente. Portanto, vamos continuar a pretender ter um diálogo abrangente com quem intervém no âmbito das relações político-estratégicas do Mundo. E a Rússia em Angola tem um papel histórico que nós todos conhecemos.

Portanto, a Rússia não pode ficar à parte.

Eu penso que seria uma ilusão se nós quisermos excluir um actor com o protagonismo e a influência que tem. É um país detentor de material nuclear, atómico, tecnológico e com relações institucionais com uma boa parte membro dos BRICS. Uma realidade e, portanto, é preciso muita gente começar a saber fazer contas a esse nível e não excluir nunca ninguém.

Falando agora do que se passa em em Angola, a UNITA e o MPLA concordaram em participar numa comissão negocial inter partidária sobre as eleições autárquicas. Estamos então mais perto de um entendimento sobre a organização destas eleições?

Não deixa de ser importante referir que esta é provavelmente a questão mais central naquilo que é a agenda política actual. Como sabe, as autarquias locais em Angola nunca tiveram lugar e nunca tiveram lugar porque o partido que governa o país tem medo de dar ao povo soberano as condições de escolher os governantes locais. Isto vem de um vício de nomeações não democráticas. Hoje nós temos administradores em todo o país, mas que não têm legitimidade porque não foram escolhidos pelo povo e obedecem a quem os governa, ou seja. o Presidente da República. Nós temos vindo a retardar o desenvolvimento, temos vindo a retardar a proximidade, temos vindo a retardar a qualidade da própria governação como consequência deste problema. Aquilo que eu sinto é que as desculpas se esgotaram e é impossível dizer-se que é pela incapacidade dos deputados porque os deputados não têm a este nível nenhuma responsabilidade. Hoje, felizmente, temos uma comissão que está sentada com o propósito de debater os conteúdos da lei última que falta aprovar há muitos anos. Eu faço votos que, no espaço mais curto possível, nós tenhamos de facto esta lei aprovada e, de facto, a condição de termos eleições autárquicas em todo o país e em simultâneo, que é este o grande elemento que nos diferencia do partido do regime que continua a não querer fazer eleições autárquicas simultaneamente em todo o país, apesar de ter sido retirado gradualismo constitucional que lá se encontrava.

E esse curto espaço de tempo, estamos a falar de meses, estamos a falar de anos? Qual é que é o roadmap, o plano para daqui a algum tempo os angolanos então irem às urnas nas eleições autárquicas?

Olhe, a UNITA tem um projecto de lei bastante completo sobre a mesa. O projecto de lei do Governo é mais pequeno, Enfim, tem aspetos de facto que levantam a necessidade de debate. Mas é um debate que na especialidade, se houver vontade, não temos motivo nenhum para ser mais do que 30 dias. Não há motivo absolutamente nenhum. Agora nós entendemos que não há razão nenhuma de adiar as autarquias para além de 2025.

Esta comissão pode ser um primeiro passo para atenuar o tal clima de intolerância política do qual a UNITA se tem vindo a queixar nesta legislatura?

O clima de violação das leis, eu prefiro chamar-lhe assim a tal intolerância, infelizmente, está hoje dirigido a toda a gente. Aquilo que ontem era um problema da UNITA, hoje é um problema de todos os que pensam diferente, inclusive do MPLA. Os membros do MPLA que, por etapas, vêm a público dizer o que pensam, são punidos, são afastados, sofrem as consequências, são demitidos. Daí a quantidade de leis que este partido de regime vem aprovando nos últimos anos de proteccionismo exagerado do Estado e a qualidade da democracia. Todos os meses, todos os dias, naquele nosso país e, portanto, é preciso todos nós pensarmos que temos que agir e temos que agir depressa, porque Angola hoje faz face a uma crise que não é política, apenas é uma crise social da mais grave consequência, uma crise económica terrível que afecta as famílias e as empresas. A estabilidade de toda a gente. É uma crise institucional, porque as instituições estão doentes com a gravidade de que não temos independência do poder judicial, não temos independência da própria Assembleia.

E em relação à liberdade de imprensa e o lugar dos jornalistas? Angola subiu 21 lugares no ranking da liberdade de imprensa. Mas continuamos a ouvir falar todos os dias de jornalistas ameaçados que se vêem até alguns obrigados a sair do país. O clima melhorou mesmo, ou muitos já nem sequer se manifestam e por isso, simplesmente batem com a porta?

Eu penso que esta subida poderá ser fruto dos dólares angolanos que servem para comprar uma imagem. O regime angolano fez uma opção desde meio o ano passado para hoje, que é a compra das conferências internacionais em Angola. Paga as conferências, paga as estadias, diminui os custos a quem viaja, vende uma Angola ilusória. Mas a circunstância de vida dos angolanos piora todos os dias. Como qualquer observador isento verifica com as lutas sociais extremadas com a própria UNTA, central sindical, com vínculos de proximidade ao regime, a fazer greves sem limites e a aderir como nunca no passado.

Sobre a crise económica e as lutas sindicais do país, é verdade que os sindicatos se têm mobilizado no último ano em múltiplas greves, como acabou a dizer, devido às condições de vida no país, nomeadamente o aumento do custo de vida que é enorme. O salário mínimo acaba de subir para 100.000 kwanzas. Será que este aumento chega para quem, por exemplo, quem vive em Luanda e que tem um nível de vida semelhante ao de Lisboa ou de alguém que vive aqui em França, por exemplo, em Estrasburgo?

Eu vou lhe dar um exemplo muito concreto do que se passa com o valor do kwanza. Nós tivemos as eleições em Agosto de 2022 e nesta altura 1.000 euros custavam 420.000 kwanzas. Passados menos de dois anos, um ano e portanto, oito meses, hoje o Kwanza vale três vezes menos. Quando não se tem um país que produz o que consome e é tudo importado, esta consequência vai directamento para o bolso do chefe de família, vai direto em cima para as empresas e é insuportável. O que é que significa? Significa que os 100.000 kwanzas de hoje correspondem, na verdade, 33.000 kwanzas. Portanto, este salário não é o salário que as pessoas possam imaginar e corresponde 100 euros mais ou menos. 100 euros para uma família que tipicamente é grande, que tem filhos a estudar, que tem que apanhar transportes. Tudo aumentou porque dá ideia que quem está a governar está a governar ao acaso, não têm uma agenda. Há uma depreciação do kwanza e simultaneamente há o aumento dos custos dos combustíveis e o disparo da cesta básica, quer dizer, uma inflação que ultrapassou os 40%.

Outra realidade no sul de Angola é a fome e a fome. Devido à seca, tardam cada vez mais soluções para a população que vive então esta seca extrema. Recentemente noticiamos aqui na RF que as famílias angolanas vão à Namíbia procurar comida nos contentores do lixo. O que é que a UNITA propõe para estas famílias?

É um drama. Gostaria muito de dizer sim, tem razão. É apenas um problema do Sul de Angola. Mas não, este é um problema de todas as províncias do país. A fome hoje bateu à porta não apenas da classe mais desprotegida, mas bateu à porta da classe média. A classe média em Angola desapareceu. Nós hoje temos um fosso enorme entre a extrema pobreza e os hiper ricos, que continuam a acumular cada vez mais capital. Quem são? São os membros do Governo, que são os verdadeiros empresários que competem com os outros empresários de vocação, que estão falidos, todos eles abandonados. Porquê? Por causa do senhor presidente que só faz contratação simplificada. Quanto à fome, hoje temos que nos sentar todos e rápido, porque as consequências da pobreza não devem ultrapassar determinado limite de ruptura. Porque depois eu não sei se nós vamos ter capacidade de segurar as consequências no país.

E enquanto tudo isto acontece em território angolano, Angola é vista a nível do continente como um país capaz de mediar conflitos a nível internacional e, por exemplo, a União Africana tem tanta confiança nas capacidades diplomáticas do Presidente João Lourenço que acabou por designa-lo como o campeão da paz. Também tem essa confiança no presidente João Lourenço?

Quanto terá custado esta questão? Quanto terá custado em dinheiro angolano? Por exemplo, há uma rotatividade na SADC, há uma rotatividade na União Africana todos sabem que não era a vez de Angola estar a presidir. Sabem que também não será a vez de Angola no próximo ano. E todos sabem que estamos a um passo de garantir que poderá ter a presidência da União Africana. Quanto é que isto custa ao bolso dos angolanos? Quantos pobres vamos crescer perante esta venda de ilusões? Porque depois isto não leva nada. O tempo continua a rodar, amanhã já não está na governação. As verdades vêm ao de cima. Não tenho dúvidas nenhumas que isso não tem valor nenhum, porque isso não corresponde à verdade. Nós fomos obrigados a mover um processo de impeachment ao Presidente da República por violações à Constituição, por violações às leis, por violações, aos direitos humanos, por corrupção ativa. Portanto, como é que é possível juntar as duas circunstâncias, ter o campeão da paz e, simultaneamente, o violador das leis? Isto é incompatível. O tempo de mudança está aí. Só não vê quem não quer. Ele vai nos chegar também, seguramente, a Angola. As autarquias são o intermédio que nos pode ajudar a diminuir as exposições. Mas nós estamos atentos para que 2027 traga efectivamente a mudança que nós esperamos. Muito obrigado.

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